sexta-feira, 3 de novembro de 2023

Um relato de situação vivida da beleza como mediadora do conflito

     Assim que José Maria começou a lecionar naquela instituição era perceptível o desprezo dos colegas pelo professor recém-formado e recém-chegado. Um dos motivos, muito provável, é o jeito simples do homem.
     “Noutro” dia, as gargalhadas eram ouvidas de longe e vinham da sala dos professores. Um dos docentes tinha dito que quase dava dez reais para o colega José Maria ir merendar, tamanha cara de fome do novato.
     José Maria veio de família humilde – bem humilde mesmo. Dessas que tira o sustento da roça e não se preocupam tanto com o sol. Acontece que hoje ele é professor no Ensino Superior, mas com o perfil da pele queimada do sol com diversas manchas nos rosto – a cor dele é acinzentada – é moreno - da cor indiana. A magreza do professor deixa claro os tempos de rara comida. Sua cabeça achatada lembra um pouco o formato da cabeça de uma cobra. O cabelo cortado bem baixo – quase careca – é uma amostra da dificuldade de penteá-lo caso crescesse. E as roupas são bem típicas do interior – simples: botinas velhas, camisas listradas; as calças que ele usa normalmente são da cor marrom.
     A verdade é que José não tem o perfil do belo “praquele” lugar. Nem pra Ensino Médio, quiçá no Ensino Superior. Num rápido olhar o que se percebe é uma maioria branca e bem vestida; com uma altivez típica dos que nasceram para vencer e, que sempre estão de posse da verdade de todas as coisas.  
     Contudo, como o mundo dá voltas, num dia desses houve uma prova para coordenador e dentre todos os mestres, foi, justamente, José Maria quem passou em primeiro lugar. Nos dias seguintes ao resultado, os comentários foram os mais deploráveis possíveis.
     - Onde é que esse preto tem condições de coordenar nada.
     -Bicho “fei”. Quer ser coordenador.
     -“Hum!” ninguém vai respeitar.
     O que ninguém esperava é que com os primeiros salários e o conforto das salas com ar condicionado, em poucos meses a pele do professor recém-chegado clareou muito e o visual de roupas mudou. Ao assumir o posto, nos meses seguintes o que mais se viu foi uma ‘rasgação” de seda dos colegas com o antes discriminado José Maria.
    


REFERÊNCIAS



Morgan, Gareth, 1943 - Imagens da organização: edição executiva/Gareth Morgan; tradução Geni G. Goldschmidt. - 2. ed. - 4a reimpressão - São Paulo : Atlas, 2002.

Silva, José Maria da. Apresentação de trabalhos acadêmicos: normas e técnicas/José  Maria da Silva , Emerson Sena da Silveira. 5. Ed. – Petrópolis, RJ : Vozes, 2009

Pinheiro, Ivan Antônio Negociação e arbitragem / Ivan Antônio Pinheiro. – Florianópolis : Departamento de Ciências da Administração / UFSC; [Brasília] : CAPES : UAB, 2012.
         82p. : il.





Macamboezio
Eu tinha seis anos e uma timidez paralisante. Morava no Tatuapé e era alfabetizado
na Penha, na zona leste de São Paulo. Ia e voltava num ônibus escolar,
daqueles que tinham uma porta só, na frente, ao lado do motor barulhento. Não
os vejo mais nas ruas. Foram fracionados em vans coreanas.
Num trajeto de ida, eu já estava num banco, quieto como uma ostra, quando
entrou no ônibus um garoto branquinho e sardento, do meu tamanho. Sentou-se
ao meu lado e começou a tagarelar. Contou uma piada e eu sorri. Contou outra,
sorri de novo. Contou uma terceira piada que eu nem ouvi, enquanto revirava a

memória, à procura de algo engraçado para retribuir. Ele terminou a terceira história
e eu emendei, orgulhoso, o que me ocorreu de mais hilariante. Tinha ouvido
de minha irmã mais velha:
— Meu amor, minha vida, minha privada entupida!
O garoto ergueu as sobrancelhas, arregalou os olhos e levou uma das mãos à boca.
Ele, escandalizado. Eu, petrificado. O ronco do ônibus, amplificado, ensurdecedor.
— Eu vou contar para a Diretora que você disse isso!
Entrei em pânico. Ele notou.
— Se você não me der uma bala eu vou contar para a Diretora! — ameaçou.
A chantagem foi enfática e imediata. Eu não tinha a bala. Nem o dinheiro.
Prometi entregar o produto extorquido no dia seguinte. E cumpri.
Fiz isso mais vezes, nos dois ou três dias que vieram depois.
Mas, em casa, à noite, aos olhos de meu pai, minha introspecção tornou-
se um mistério que nem a timidez explicava. Eu não contei nada,
constrangido com a barbaridade que tinha proferido a um colega.
E das consequências desastrosas que aquilo teria se chegasse aos
ouvidos da Diretora. Meu pai:
— Cuco (é como me chama), você anda meio macambúzio
(é como se refere ao sentimento de tristeza). O que aconteceu?
Por vergonha, tentei disfarçar. Mas ele insistiu e eu contei. Foi
a primeira vez na vida em que experimentei a sensação física de
“botar os demônios pra fora”. No dia seguinte, quando o ônibus
da escola se aproximou da casa do menino chantageador, não
me vieram a taquicardia, a angústia. Ao me estender a mão, em
cobrança da bala extorquida, ele ouviu meu primeiro discurso
de improviso. Duas frases, apenas:
— Meu pai me disse que hoje não tem bala. E que eu e você
vamos contar tudo isso para a Diretora.
A extorsão acabou. E começou um novo ciclo de minha infância.
Todos os que ouviram essa história, nos últimos 40 anos, dividem
a perplexidade entre minha ingenuidade e a precocidade
do menino chantagista.
Para mim, hoje, pai de três crianças, o mais relevante ainda é o
olhar de meu pai.
(William Bonner. In: Luís Colombini. Aprendi com meu pai. São Paulo: Saraiva. p. 235.)


1ª O texto lido é o relato de um episódio vivido pelo narrador.  Em que fase da vida do narrador o episódio ocorreu?


(A) Na fase adolescente;

(B) Na fase infantil;


2ª 4ª O relato em estudo foi escrito em uma linguagem de acordo com a norma-padrão, mas, em alguns momentos, o narrador procura se aproximar do interlocutor, lançando mão de determinados recursos. Identifique, nos trechos abaixo, a estratégia utilizada pelo autor para se aproximar de seus leitores. 

(A) A palavra tagarelar remete a um contexto informal.

(B) Eu tinha seis anos e uma timidez paralisante.


3º Onde se passaram os eventos que fizeram parte do episódio?

(A) No corredor da escola e na sala de aula;

(B) No ônibus escolar e na casa do menino;



4º Inferee-se do texto "Um relato de situação vivida da beleza como mediadora do conflito" 

(A) Os colegas professores zombavam do jeito simples de José Maria;

(B) José Maria era muito prestigiado pelos seus colegas de trabalho;


5º É implicíto no texto que

(A) a beleza depende do jeito de ser mais eletizado e do modo de se vestir do indivíduo;

(B) a beleza depende da íntimo de cada pessoa e de sua simpatia nas relações com outros;



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