sábado, 5 de novembro de 2022

13º Plan 3º CORRESPONDÊNCIAS – CLARICE LISPECTOR e João Guimarães Rosa

 
1ª 1ª 4 (ENEM2000)

(A) são preservadas a coerência e a correção gramatical ao se ligarem os dois primeiros períodos sintáticos do texto pela conjunção porque, do seguinte modo: humanas, porque o ser.


(B) a expressão "Em sua opinião" (l.13) remete às opiniões de Newton, Leibnitz e Kant.



2ª 1ª 4 (ENEMaBmai2000)

Quem é pobre, pouco se apega, é um giro-o-giro
no vago dos gerais, que nem os pássaros de rios e
lagoas. O senhor vê: o Zé-Zim, o melhor meeiro meu
aqui, risonho e habilidoso. Pergunto: — Zé-Zim, por
que é que você não cria galinhas-d'angola, como todo
o mundo faz? — Quero criar nada não... — me deu resposta:
— Eu gosto muito de mudar... [...] Belo um dia,
ele tora. Ninguém discrepa. Eu, tantas, mesmo digo.
Eu dou proteção. [...] Essa não faltou também à minha
mãe, quando eu era menino, no sertãozinho de minha
terra. [...] Gente melhor do lugar eram todos dessa família
Guedes, Jidião Guedes; quando saíram de lá, nos
trouxeram junto, minha mãe e eu. Ficamos existindo
em território baixio da Sirga, da outra banda, ali onde
o de-Janeiro vai no São Francisco, o senhor sabe.
ROSA, J. G. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro:
José Olympio (fragmento).
Na passagem citada, Riobaldo expõe uma situação decorrente
de uma desigualdade social típica das áreas
rurais brasileiras marcadas pela concentração de terras
e pela relação de dependência entre agregados e fazendeiros.


No texto, destaca-se essa relação porque o personagem narrador


(A). denuncia a falta de compromisso e a desocupação dos moradores, que pouco se envolvem no trabalho da terra.

(B). mostra como a condição material da vida do sertanejo é dificultada pela sua dupla condição de homem livre e, ao mesmo tempo, dependente.

— Famigerado? [...]

— Famigerado é “inóxio”, é “célebre”, “notório”, “notável”...

— Vosmecê mal não veja em minha grossaria no não entender. Mais me diga: é desaforado? É caçoável? É de

arrenegar? Farsância? Nome de ofensa?

— Vilta nenhuma, nenhum doesto. São expressões

neutras, de outros usos...

— Pois... e o que é que é, em fala de pobre, linguagem

de em dia de semana?

— Famigerado? Bem. É: “importante”, que merece

louvor, respeito...

 

ROSA, G. Famigerado. In: Primeiras estórias􀀑􀀃􀀵􀁌􀁒􀀃􀁇􀁈􀀃􀀭􀁄􀁑􀁈􀁌􀁕􀁒􀀝􀀃􀀱􀁒􀁙􀁄􀀃􀀩􀁕􀁒􀁑􀁗􀁈􀁌􀁕􀁄􀀏􀀃􀀕􀀓􀀓􀀔􀀑

 

3. 2 4. 44 (ENEM 2018) Nesse texto, a associação de vocábulos da língua portuguesa é determinado pelo

(A) grau de coloquialidade da ComunicAção.

(B) nível de intimidade entre os interlocutores.



4. 3ª A paritr da leitura do texto do link, MARQUE A ALTERNATIVA CORRETA https://isaacsabino.blogspot.com/2014/10/desmundo-linguagem-consciencia-uma.html


a) Em Desmundo é perceptível variação linguística histórica.

c) A língua não varia nem em tempo, nem em espaço.



5. 4. 5 No que diz respeito a Guimarães Rosa, marque a assertiva CORRETA


(A) Diferentemente dos românticos, dos realistas e dos modernistas da geração de 30, o autor realizou novas experiências estéticas na ficção regionalista, sobretudo em relação à linguagem.


(B) Igual os românticos e os realistas e diferente dos modernistas da geração de 30, o autor realizou novas experiências estéticas na ficção regionalista, sobretudo em relação à linguagem.



6. 5 OBRAS DE GUIMARÃES ROSA


(A) Sagarana (1946), mas foi a partir da publicação de duas obras-primas, Grande sertão: veredas e Corpo de baile, em 1956, que se tornou um escritor amplamente reconhecido e aclamado pela crítica. Publicou também Primeiras estórias (1962) e Tutameia – Terceiras estórias (1967). Em 1967


(B) Sagarana (1946), mas foi a partir da publicação de duas obras-primas, Grande sertão: veredas e Corpo de baile, em 1956, que se tornou um escritor amplamente reconhecido e aclamado pela crítica. Publicou também A Paixão seugndo GH (1962) e Tutameia – Terceiras estórias (1967). Em 1967


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     Um bom professor de Literatura é aquele que incentiva ao máximo a escrita e a leitura por parte de seus alunos; incentiva de uma forma alegre, prazerosa, não deixando nunca, que nos seus discentes, se gere aversão aos livros. Se tudo der certo deve haver o amor, o apego, a curiosidade, a todo tipo de literatura. 
      Recomendar o livro certo é o marco decisório na vida de quem irá ler para sempre, todos os dias. Com Clarice Lispector, por exemplo, o professor ao invés de pedir que o aluno conheça a escritora através da leitura de seus contos, crônicas ou romances introspectivos, pode muito bem recomendar a leitura de Correspondências. 
    O livro é uma composição de cento e vinte seis cartas, onde parte dessas, escritas por Clarice Lispector e destinadas aos seus familiares e amigos; outra parte, recebidas por Clarice. 
   Quem nunca teve a curiosidade de abrir e ler cartas alheias. Pois em Correspondências esta curiosidade será saciada, e junto, o leitor conhecerá uma Clarice Lispector humana, desmistificada, mãe e acima de tudo muito amiga.  As cartas remeterão o leitor (aluno ou mesmo o professor) ao círculo de amizades da escritora, numa ordem cronológica; uma oportunidade única de conhecer Clarice Lispector no início de sua carreira: as primeiras publicações; a angústia diante da crítica; o namoro, o casamento, os filhos, os amigos. 
       Outra riqueza em Correspondências são as cartas recebidas pela escritora, um verdadeiro círculo de um momento literário: Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Lygia Fagundes Telles, Ledo Ivo, Rubem Braga, Fernando Sabino e outros demonstram intimidades e muita admiração pela escritora, dividindo além das correspondências freqüentes, as angústias pela publicação de algo; os momentos de preguiça para escrever, e os fatos que acometem o Brasil naquele momento da história. 
      Indicar Correspondências aos alunos iniciantes da leitura desta Literatura mais complexa é acima de tudo permitir uma viagem com olhares sobre a história do Brasil e do mundo nos períodos de 40 a 70; uma viagem gostosa, desmistificadora deste mundo, que os dos escritores e poetas; uma viagem de requinte nestas correspondências daqueles que representavam a elite financeira, cultural do país naquele momento.



1ª QUAIS AS DICAS PARA ESCREVER UMA CARTA DE APRESENTAÇÃO?



(A) • Se o departamento ou o nome da pessoa que vai receber a carta for conhecido, não precisa se ao departamento ou à pessoa no início do texto.
• Não Mencione no texto o nome da empresa.
• Faça referência a qualidades e características que sejam requisitos relacionados, de fato, ao trabalho a ser realizado. O anúncio da vaga pode ajudar a saber quais são elas.
• Não faça referência a defeitos.


(B) • Se o departamento ou o nome da pessoa que vai receber a carta for conhecido, dirija-se diretamente ao departamento ou à pessoa no início do texto.
• Mencione no texto o nome da empresa.
• Faça referência a qualidades e características que sejam requisitos relacionados, de fato, ao trabalho a ser realizado. O anúncio da vaga pode ajudar a saber quais são elas.
• Não faça referência a defeitos.


2ª Releia o trecho:

“Como me parece que você e os leitores da revista queriam me conhecer um pouco melhor antes de assinar o contrato, envio-lhe meu curriculum (é assim que se escreve?), mas não tão completo porque de algumas coisas já não me lembro mais.”

O trecho parece adequado para uma carta de apresentação com vistas a um emprego?

(A) Sim, pois, aparentemente, demonstra preparo do autor.

(B) Não, pois, aparentemente, demonstra despreparo do autor.


3º Quais sentidos esses dizeres de Mafalda permitem que os leitores construam sobre ela?

(A) Os de que ela é uma garota discreta, mentirosa, desonesta, finge saber o que não sabe para tentar impressionar.


(B) Os de que ela é uma garota espontânea, sincera, franca, não finge saber o que não sabe para tentar impressionar.


4º Na carta que escreve, Mafalda apresenta as informações que julga serem relevantes para seu novo trabalho. Com base nas respostas às questões anteriores, levante hipóteses sobre qual seria a relevância das seguintes informações:

“Eu não entendi muito bem, mas fiquei contente de saber a verdade, porque a maioria das crianças da escola falam que os nenéns nascem em repolhos ou que a cegonha os traz de Paris...”


(A) Mostra que Mafalda é uma criança esperta, que não se conforma com respostas que não façam sentido para ela.

(B) Mostra que Mafalda é uma criança quieta, que se conforma com espostas que não façam sentido para ela.


5º Infere-se do texto "Correspondências de Clarice Lispector".

(A) Recomendar o livro certo é o marco decisório na vida de quem irá ler para sempre, todos os dias. Com Clarice Lispector, por exemplo, o professor ao invés de pedir que o aluno conheça a escritora através da leitura de seus contos, crônicas ou romances introspectivos, pode muito bem recomendar a leitura de Correspondências.

(B) Recomendar o livro certo é o marco decisório na vida de quem irá ler para sempre, todos os dias. Contudo, mesmo assim, ainda haverá o trauma. Com Clarice Lispector, por exemplo, o professor deve pedir que o aluno conheça a escritora através da leitura de seus contos, crônicas ou romances introspectivos, pode muito bem recomendar a leitura de Correspondências.

























1ª QUAIS OS DIFERENTES OBJETIVOS DE UMA CARTA DE APRESENTAÇÃO?

(A) apresentar um livro, um grupo, uma pessoa ou a si mesmo.

(B) apresentar um currículo, um grupo, um negócio ou uma pessoa.


2ª INFERES-SE DO TEXTO ACIMA


(A)  Indicar Correspondências aos alunos iniciantes da leitura desta Literatura mais complexa é acima de tudo permitir uma viagem com olhares sobre a história do Brasil e do mundo nos períodos de 40 a 70;


(B)  Indicar Correspondências aos alunos iniciantes da leitura desta Literatura mais complexa não é o recomdável porque, acima de tudo,  é uma viagem no Brasil e do mundo nos períodos de 40 a 70 inveável ao jovem;


Senhor diretor de Siete Días [revista de Buenos Aires]
Um amigo meu, o desenhista Quino (se chama assim, mas
quando assina cheques põe Joaquín Lavado), me disse que você
teria muito interesse em contratar a mim e a meus amiguinhos,
Susanita, Felipe, Manolito e Miguelito, para juntos trabalharmos
todas as semanas em sua revista.
Aceitamos com muito gosto, mas antes devo dizer a você que
em minha casa a família aumentou, porque em 21 de março nasceu
meu irmãozinho, o que alegrou bastante meu pai e minha
mãe; e a mim trouxe curiosidade. Agora estamos todos muito
preocupados em cuidar dele e pensando em um nome de que
ele goste quando for grande. Como me parece que você e os leitores
da revista queriam me conhecer um pouco melhor antes
de assinar o contrato, envio-lhe meu curriculum (é assim que
se escreve?), mas não tão completo porque de algumas coisas já
não me lembro mais. [...]

Na vida real eu nasci em 15 de março de 1962. Meu pai é corretor
de seguro, e em casa se entretém cuidando de plantas. Minha
mãe é dona de casa. Eles se conheceram quando estudavam
juntos na faculdade, mas depois ela abandonou o curso para,
segundo ela, cuidar melhor de mim. O nome que me colocaram
foi em homenagem a uma menina que trabalhava no filme “Dar

a cara”, feito com base no livro do escritor David Viñas. Em 22
de setembro de 1964, Quino conseguiu uma recomendação para
que eu trabalhasse na revista Primeira Plana, e em março de
1965 me levaram ao jornal diário El Mundo. [...]
Nos últimos dias recebi muitas cartas e telefonemas perguntando
sobre meu irmãozinho. Quase todos se preocupam
em saber como meus pais me explicaram o assunto. Foi assim:
me chamaram um dia, ficaram muito corados, disseram
que tinham de me dizer algo muito importante. Meu pai me
contou que eles haviam encomendado um irmãozinho para
mim, que antes de ele nascer minha mãe cuidaria dele, porque
ele cresce como uma sementinha, e que havia plantado
nela porque sabe muito de plantas. Eu não entendi muito bem, mas
fiquei contente de saber a verdade, porque a maioria das crianças da
escola falam que os nenéns nascem em repolhos ou que a cegonha os
traz de Paris... [...]


[...] gosto de ler, escutar os noticiários, ver TV (menos as séries), brincar
de xadrez, boliche e balanço. Gosto muito de brincar e correr ao ar livre,
onde haja árvores e passarinhos, como em Bariloche. Quando fomos de
férias para lá, passamos dias muito bonitos. Esse ano não saímos de férias,
porque esperávamos a chegada de meu irmãozinho. [...]
Entre as coisas de que não gosto estão: primeiro, sopa; depois, que me
perguntem se gosto mais do papai ou da mamãe; ainda, o calor e a violência.
Por isso, quando for grande, vou ser tradutora da ONU. Mas quando os
embaixadores brigarem, vou traduzir tudo ao contrário, para que se entendam
melhor e haja paz de uma vez por todas.
Até a semana que vem,
Mafalda
(Sergio Moreno. In: Quino. Toda Mafalda. 22. ed. Buenos Aires:
Ediciones de la Flor, 2010. p. 570-571. Tradução dos autores.)




3º Sobre a carta de apresentação lida, responda às perguntas a seguir e justifique suas respostas com trechos do texto. Quem se apresenta a quem?


(A)  Mafalda se apresenta ao diretor da revista Siete Dias, conforme indicam o vocativo e a assinatura.


(B)  Cebolinha se apresenta ao diretor da revista Siete, conforme indicam o vocativo e a assinatura.



4º No último trecho, há dados cuja presença é importante em cartas de apresentação profissional. Identifique quais são eles e comente essa afirmação.

(A)  Esses dados se referem à aparência profissional. Mafalda menciona que é bonita e já, por isso, já trabalhou em outros veículos de comunicação e, portanto, estaria qualificada para a atividade.

(B)  Esses dados se referem à experiência profissional. Mafalda menciona que já trabalhou em outros
grandes veículos de comunicação e, portanto, estaria qualificada para a atividade.





5ª A carta de Mafalda foi publicada na seção da revista Siete Días na qual, da semana seguinte em diante, circulariam tiras semanais com a personagem. Tendo em vista essa informação, responda: Quem, de fato, escreveu a carta?

(A) QUINO;

(B) MAFALDA



Link para o gabarito das questões



LINK PARA DISSERTAR SOBRE TEMA: O VALOR DA EDUCAÇÃO NAS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS DO BRASIL.





      








Amor
Um pouco cansada, com as compras deformando o novo saco de tricô, Ana
subiu no bonde. Depositou o volume no colo e o bonde começou a andar. Recostou-
se então no banco procurando conforto, num suspiro de meia satisfação.
Os filhos de Ana eram bons, uma coisa verdadeira e sumarenta. Cresciam, tomavam
banho, exigiam para si, malcriados, instantes cada vez mais completos.
A cozinha era enfim espaçosa, o fogão enguiçado dava estouros. O calor era forte
no apartamento que estavam aos poucos pagando. Mas o vento batendo nas cortinas
que ela mesma cortara lembrava-lhe que se quisesse podia parar e enxugar
a testa, olhando o calmo horizonte. Como um lavrador. Ela plantara as sementes
que tinha na mão, não outras, mas essas apenas. E cresciam árvores. Crescia sua
rápida conversa com o cobrador de luz, crescia a água enchendo o tanque, cresciam
seus filhos, crescia a mesa com comidas, o marido chegando com os jornais
e sorrindo de fome, o canto importuno das empregadas do edifício. Ana dava a
tudo, tranquilamente, sua mão pequena e forte, sua corrente de vida.
Certa hora da tarde era mais perigosa. Certa hora da tarde as árvores que
plantara riam dela. Quando nada mais precisava de sua força, inquietava-se [...]
No fundo, Ana sempre tivera necessidade de sentir a raiz firme das coisas. E
isso um lar perplexamente lhe dera. Por caminhos tortos, viera a cair num destino
de mulher, com a surpresa de nele caber como se o tivesse inventado. O homem
com quem casara era um homem verdadeiro, os filhos que tivera eram filhos
verdadeiros. Sua juventude anterior parecia-lhe estranha como uma doença


de vida. Dela havia aos poucos emergido para descobrir que também sem a felicidade
se vivia: abolindo-a, encontrara uma legião de pessoas, antes invisíveis,
que viviam como quem trabalha — com persistência, continuidade, alegria. [...]
Sua precaução reduzia-se a tomar cuidado na hora perigosa da tarde, quando
a casa estava vazia sem precisar mais dela, o sol alto, cada membro da família
distribuído nas suas funções. Olhando os móveis limpos, seu coração se
apertava um pouco em espanto. Mas na sua vida não havia lugar para que sentisse
ternura pelo seu espanto — ela o abafava com a mesma habilidade que as
lides em casa lhe haviam transmitido. Saía então para fazer compras ou levar
objetos para consertar, cuidando do lar e da família à revelia deles. Quando voltasse
era o fim da tarde e as crianças vindas do colégio exigiam-na. Assim chegaria
a noite, com sua tranquila vibração. De manhã acordaria aureolada pelos
calmos deveres. Encontrava os móveis de novo empoeirados e sujos, como se
voltassem arrependidos. Quanto a ela mesma, fazia obscuramente parte das
raízes negras e suaves do mundo. E alimentava anonimamente a vida. Estava
bom assim. Assim ela o quisera e escolhera.
[...]
O bonde se arrastava, em seguida estacava. Até Humaitá tinha tempo de descansar.
Foi então que olhou para o homem parado no ponto.
A diferença entre ele e os outros é que ele estava realmente

parado. De pé,
suas mãos se mantinham avançadas. Era um cego.
O que havia mais que fizesse Ana se aprumar em desconfiança? Alguma coisa
intranquila estava sucedendo. Então ela viu: o cego mascava chicles... Um homem
cego mascava chicles.
Ana ainda teve tempo de pensar por um segundo que os irmãos viriam jantar
— o coração batia-lhe violento, espaçado. Inclinada, olhava o cego profundamente,
como se olha o que não nos vê. Ele mascava goma na escuridão. Sem sofrimento,
com os olhos abertos. O movimento da mastigação fazia-o parecer sorrir e de repente
deixar de sorrir, sorrir e deixar de sorrir — como se ele a tivesse insultado,
Ana olhava-o. E quem a visse teria a impressão de uma mulher com ódio. Mas continuava
a olhá-lo, cada vez mais inclinada — o bonde deu uma arrancada súbita jogando-
a desprevenida para trás, o pesado saco de tricô despencou-se do colo, ruiu
no chão — Ana deu um grito, o condutor deu ordem de parada antes de saber do
que se tratava — o bonde estacou, os passageiros olharam assustados.
Incapaz de se mover para apanhar suas compras, Ana se aprumava pálida.
Uma expressão de rosto, há muito não usada, ressurgia-lhe com dificuldade, ainda
incerta, incompreensível. O moleque dos jornais ria entregando-lhe o volume.
Mas os ovos se haviam quebrado no embrulho de jornal. Gemas amarelas
e viscosas pingavam entre os fios da rede. O cego interrompera a mastigação


e avançava as mãos inseguras, tentando inutilmente pegar o que acontecia. O
embrulho dos ovos foi jogado fora da rede e, entre os sorrisos dos passageiros e o
sinal do condutor, o bonde deu a nova arrancada de partida.
Poucos instantes depois já não a olhavam mais. O bonde se sacudia nos trilhos
e o cego mascando goma ficara atrás para sempre. Mas o mal estava feito.
A rede de tricô era áspera entre os dedos, não íntima como quando a tricotara. A
rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido; não sabia o que fazer
com as compras no colo. E como uma estranha música, o mundo recomeçava ao redor.
O mal estava feito. Por quê? Teria esquecido de que havia cegos? A piedade a sufocava,
Ana respirava pesadamente. Mesmo as coisas que existiam antes do acontecimento
estavam agora de sobreaviso, tinham um ar mais hostil, perecível... O mundo se tornara
de novo um mal-estar. Vários anos ruíam, as gemas amarelas escorriam. [...]
[...]


Ela apaziguara tão bem a vida, cuidara tanto para que esta não explodisse.
Mantinha tudo em serena compreensão, separava uma pessoa das outras, as
roupas eram claramente feitas para serem usadas e podia-se escolher pelo jornal
o filme da noite – tudo feito de modo a que um dia se seguisse ao outro. E
um cego mascando goma despedaçava tudo isso. E através da piedade aparecia a
Ana uma vida cheia de náusea doce, até a boca.
Só então percebeu que há muito passara do seu ponto de descida. Na fraqueza
em que estava, tudo a atingia com um susto; desceu do bonde com pernas
débeis, olhou em torno de si, segurando a rede suja de ovo. Por um momento não
conseguia orientar-se. Parecia ter saltado no meio da noite.
Era uma rua comprida, com muros altos, amarelos. Seu coração batia de
medo, ela procurava inutilmente reconhecer os arredores, enquanto a vida que
descobrira continuava a pulsar e um vento mais morno e mais misterioso rodeava-
lhe o rosto. Ficou parada olhando o muro. Enfim pôde localizar-se. Andando
um pouco mais ao longo de uma sebe, atravessou os portões do Jardim Botânico.
Andava pesadamente pela alameda central, entre os coqueiros. Não havia
ninguém no Jardim. Depositou os embrulhos na terra, sentou-se no banco de
um atalho e ali ficou muito tempo.
[...]
As árvores estavam cacarregadas, o mundo era tão rico que apodrecia. Quando
Ana pensou que havia crianças e homens grandes com fome, a náusea subiu-lhe à
garganta, como se ela estivesse grávida e abandonada. A moral do Jardim era outra.
Agora que o cego a guiara até ele, estremecia nos primeiros passos de um mundo
faiscante, sombrio, onde vitórias-régias boiavam monstruosas. As pequenas flores
espalhadas na relva não lhe pareciam amarelas ou rosadas, mas cor de mau ouro e
escarlates. A decomposição era profunda, perfumada... Mas todas as pesadas coisas,
ela via com a cabeça rodeada por um enxame de insetos enviados pela vida mais
fina do mundo. A brisa se insinuava entre as flores. Ana mais adivinhava que sentia
o seu cheiro adocicado... O Jardim era tão bonito que ela teve medo do Inferno.
Era quase noite agora e tudo parecia cheio, pesado, um esquilo voou na sombra.
Sob os pés a terra estava fofa, Ana aspirava-a com delícia. Era fascinante, e
ela sentia nojo.
Mas quando se lembrou das crianças, diante das quais se tornara culpada, ergueu-
se com uma exclamação de dor. Agarrou o embrulho, avançou pelo atalho
obscuro, atingiu a alameda. Quase corria — e via o Jardim em torno de si, com
sua impersonalidade soberba. Sacudiu os portões fechados, sacudia-os segurando
a madeira áspera. O vigia apareceu espantado de não a ter visto.
Enquanto não chegou à porta do edifício, parecia à beira de um desastre. Correu

corria e a abraçava. Apertou-o com força, com espanto. Protegia-se trêmula. Porque
a vida era periclitante. Ela amava o mundo, amava o que fora criado — amava com
nojo. Do mesmo modo como sempre fora fascinada pelas ostras, com aquele vago
sentimento de asco que a aproximação da verdade lhe provocava, avisando-a. Abraçou
o filho, quase a ponto de machucá-lo. Como se soubesse de um mal — o cego ou
o belo Jardim Botânico? — agarrava-se a ele, a quem queria acima de tudo. [...]
Deixou-se cair numa cadeira com os dedos ainda presos na rede. De que tinha
vergonha?
Não havia como fugir. Os dias que ela forjara haviam-se rompido na crosta
e a água escapava. Estava diante da ostra. E não havia como não olhá-la. De que
tinha vergonha? É que já não era mais piedade, não era só piedade: seu coração
se enchera com a pior vontade de viver.
[...]
Depois o marido veio, vieram os irmãos e suas mulheres, vieram os filhos
dos irmãos.
Jantaram com as janelas todas abertas, no nono andar. Um avião estremecia,
ameaçando no calor do céu. Apesar de ter usado poucos ovos, o jantar estava
bom. Também suas crianças ficaram acordadas, brincando no tapete com as outras.
Era verão, seria inútil obrigá-las a dormir. Ana estava um pouco pálida e ria
suavemente com os outros.
[...]
Depois, quando todos foram embora e as crianças já estavam deitadas, ela era
uma mulher bruta que olhava pela janela. A cidade estava adormecida e quente.
O que o cego desencadeara caberia nos seus dias? Quantos anos levaria até
envelhecer de novo? Qualquer movimento seu e pisaria numa das crianças. Mas
com uma maldade de amante, parecia aceitar que da flor saísse o mosquito, que
as vitórias-régias boiassem no escuro do lago. O cego pendia entre os frutos do
Jardim Botânico.
Se fora um estouro do fogão, o fogo já teria pegado em toda a casa! pensou correndo
para a cozinha e deparando com o seu marido diante do café derramado.
— O que foi?! gritou vibrando toda.
Ele se assustou com o medo da mulher. E de repente riu entendendo:
— Não foi nada, disse, sou um desajeitado. Ele parecia cansado, com olheiras.
Mas diante do estranho rosto de Ana, espiou-a com maior atenção. Depois
atraiu-a a si, em rápido afago.
— Não quero que lhe aconteça nada, nunca! disse ela.
— Deixe que pelo menos me aconteça o fogão dar um estouro, respondeu ele
sorrindo.
Ela continuou sem força nos seus braços. Hoje de tarde alguma
coisa tranquila se rebentara, e na casa toda havia um
tom humorístico, triste. É hora de dormir, disse ele, é tarde.
Num gesto que não era seu, mas que pareceu natural, segurou
a mão da mulher, levando-a consigo sem olhar para
trás, afastando-a do perigo de viver.
Acabara-se a vertigem de bondade.
E, se atravessara o amor e o seu inferno, penteava-se
agora diante do espelho, por um instante sem nenhum
mundo no coração. Antes de se deitar, como se apagasse
uma vela, soprou a pequena flama do dia.
(Clarice Lispector. Laços de família. Rio de Janeiro: José Olympio, 1977. p. 17-30.)
Nelson Provazi
A geração de 45: Clarice Lispector e Guimarães Rosa. Análise linguística: implícitos e intertextualidade. A dissertação (III) CAPÍTULO 3 225
A




1. Um dos recursos narrativos utilizados no conto em estudo é o flashback, suspensão do momento presente da ação para apresentar cenas ou situações anteriores ao que está sendo narrado. Identifique no início do texto uma situação típica do flashback.

(A)“Ela pensava nos filhos como plantas ques cresciam, não outros, mas os seus.”


(B) “Ela plantara as sementes que tinha na mão, não outras, mas essas apenas.”


A partida de trem

 

     Marcava seis horas da manhã. Angela Pralini pagou o táxi e pegou sua pequena valise. Dona Maria Rita de Alvarenga [..] desceu do Opala da Filha e encaminhavam-se para os trilhos. A velha bem-vestida e com joias. Das rugas que a disfarçavam saía a forma pura de um nariz perdido na idade, e de uma boca que outrora devia ter sido cheia e sensível. Mas que importa? Chega-se a um certo ponto — e o que foi não importa. Começa uma nova raça. Uma velha não pode comunicar-se. Recebeu o beijo gelado de sua filha que foi embora antes do trem partir.

[...]

Quando a locomotiva se pôs em movimento, surpreendeu-se um pouco: não esperava que o trem seguisse nessa direção e sentara-se de costas para o caminho.

    Angela Pralini percebeu-lhe o movimento e perguntou:

— A senhora deseja trocar de lugar comigo?

     Dona Maria Rita se espantou com a delicadeza, disse que não, obrigada, para ela dava no mesmo.

     Mas parecia ter-se perturbado. Passou a mão sobre o camafeu filigranado de ouro, espetado no peito, passou a mão pelo broche. Seca. Ofendida? Perguntou afinal a Angela Pralini:

— É por causa de mim que a senhorita deseja trocar de lugar?

LISPECTOR, C. Onde estivestes de noite. Rio de Janeiro:

Nova Fronteira, 1980 (fragmento)

2. 119 (ENEM 2015caBmai) A descoberta de experiências emocionais com base no cotidiano é recorrente na obra de Clarice Lispector.

No fragmento, o narrador enfatiza o(a)


A)  comportamento vaidoso de mulheres ricas e pobres.


B)  sentimento de solidão pelo processo de envelhecimento.



3.(ENEM 2015 Q05 CbMin adaptada) Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum Destino biológico psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam o feminino.

BEAUVOIR, S.   . 􀀲􀀃􀁖􀁈􀁊􀁘􀁑􀁇􀁒􀀃􀁖􀁈􀁛􀁒􀀑􀀃􀀵􀁌􀁒􀀃􀁇􀁈􀀃􀀭􀁄􀁑􀁈􀁌􀁕

 

Na década de 1960, a proposição de Simone de Beauvoir contribuiu para estruturar um movimento social que teve como marca o(a)


A)   ação do Poder para criminalizar a violência sexual.


B)   organização de protestos pela a igualdade de gênero.



4. 2.4.2.1º Descritor 01 – (Localizar informações explícitas em um texto) Infere-se do texto "CORRESPNDÊNCIAS" DE Clarice Lispector suas:



A)  despreocupações com a condição da mulher; os momentos de preguiça para escrever, e os fatos que acometem o Brasil naquele momento da história. .

.


B)  angústias pela publicação de algo; os momentos de preguiça para escrever, e os fatos que acometem o Brasil naquele momento da história. .




PARA A 5ª QUESTÃO RELEIA O TEXTO DO LINK https://isaacsabino.blogspot.com/2020/06/a-ideia-o-estado-religiao-sob-o-olhar.html  e marque a alterantiva CORRETA


(A)Para a religião judaico-cristã, uma divindade criou tudo, o homem, a mulher e os animais, e a partir da expulsão desses do paraíso, fez surgir o Estado.

(B)Para o marxismo, uma divindade criou tudo, o homem, a mulher e os animais, e a partir da expulsão desses do paraíso, fez surgir o Estado.





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