Embora
haja um debate, desde a antiguidade, acerca de achar o nome certo para expressar
a verdade da “coisa”, do “ser”, Dantas (2011, p. 27) lança mão de dizer que o “ser
homem” apresenta dimensão somática, psíquica, racional, individual, social,
econômica, política, sapiencial, erótica, estética, técnica, informacional,
ética etc. É uma visão macro do “ser homem”. Interessa aqui a “micro” de Stork
e Echevarría (2005) quando nomeiam o indivíduo particular de “pessoa”. Para
tanto eles partem da explicação das marcas da intimidade, manifestação, liberdade e dialogicidade, mostrando uma relação conceitual com a visão macro.
O dilema acerca de nomear a
“coisa” pelo nome que verdadeiramente a expressa remonta a antiguidade grega.
Sócrates, por exemplo, vivia perguntando aos seus conterrâneos se eles sabiam o
significado das palavras que nomeavam os atos como “coragem” ou “virtude”. [...] Tal situação
tem acontecido desde muito tempo para adjetivar o “ser” que habita isso que se
chama corpo, aquilo que todos chamam “homem” e pelo qual não se consegue achar
a palavra “una” para predicá-lo na sua essência. Só há partes. E o problema do
signo que expressa partes, resignificadas ao longo da história, como ser
“material”, “racional”, “sociopolítico”, “ético-moral”, “de práxis”, “estético”,
“religioso e transcendental”, é, justamente, o retorno à problemática
socrática, o que implica dizer que com o tempo,
todos os que optam por vários nomes ou partes para conceituar o “ser” e
diferenciá-lo dos animais, por exemplo, incorrem ao erro momentâneo com o
surgimento de uma nova tese com outra “parte”. Isso não acaba nunca se for
dessa forma. Há que se achar o predicativo que verdadeiramente expressa a essência
“homem”. E ele deve existir em alguma língua, sendo numa única palavra de forma
universal e precisará ser atemporal.
Um exemplo de termo histórico temporal e que já soa mal na
contemporaneidade é a própria palavra “homem”. Nos dias atuais querer
conceituar uma essência com esse nome deixa no ar certo machismo muito
combatido hodiernamente. A língua é cheia de ideologias, contaminada, mas é
viva e aberta, e por conta disso o emissor é responsável por procurar inovar
com substantivos e adjetivos que sejam unos e versáteis. Tarefa muito difícil, mas com diversos autores
ousando por esses caminhos. É o caso de Stork e Echevarría (2005) que em “Fundamentos da Antropologia – um ideal da
excelência humana”, trilham por significar “pessoa”.
Até bem pouco tempo várias
violações foram cometidas contra
homossexuais, judeus, mulheres e negros porque havia a percepção, na classe dominante, de que aquelas pessoas não eram gente. Essas
agressões chamaram a atenção para o entendimento de que eram “homens” e “que o
homem é inviolável e [...] porque o atentado contra o homem [...] são sempre
uma desordem” Stork e Echevarría (2005, p. 35). A partir dessa premissa a
humanidade tomou consciência da existência do “ser” no outro, mesmo o outro sendo
muito diferente. Com o surgimento de mais indivíduos na composição do “Ser
homem”, Stork e Echevarría (2005) percebem a necessidade de um trabalho em mais
este “homem” a partir de seu ser pessoal na intimidade,
manifestação, liberdade e dialogicidade.
Entende-se dos autores, que a “intimidade”
é o desconhecido e escondido da “pessoa”.
O próprio “homem” em contato consigo se ver diante de uma apresentação
conhecida e estranha sempre. “o homem tem interior, é para si, e se abre para
seu próprio interior na medida em que se atreve a conhecer-se, introduzir-se na
profundidade de sua alma” Stork e Echevarría (2005, p. 35). Nesse sentido, a intimidade é o “eu”, a alma, outro
mundo. Pela linguagem ou por alguns gestos do próprio corpo, a “pessoa” pode
deixar outro indivíduo entrar dentro de si. Dos pensadores antigos, pode-se se dizer
que a materialidade (as coisas), a razão,
as ideias sociais e políticas, os valores éticos e morais, as práticas, a
estética, a religião nascem na intimidade. É o que os dois antropólogos
chamam de manifestação.
Nisso o corpo é só uma ferramenta para a intimidade fazer acontecer a manifestação.
Que pai, que mãe, que professor não ficou feliz por ter ensinado algo ao
seu educando e obteve uma resposta com o aprendizado do discípulo? E quantos
mestres se apegam aos seus discentes passando cada parte do conhecimento com um
prazer imensurável. Tudo isso é o deixar entrar na intimidade e é um ato de dar
que poderia ser negado, porque o dono do conhecimento é livre para deixar
entrar quem quer dentro do seu interior. Essa tomada de decisão é marcada pela liberdade que é mais uma das notas que
caracterizam a pessoa segundo Stork e Echevarría (2005).
“A intimidade e a manifestação
indicam que o homem é dono de ambas, e ao sê-lo, é dono de si mesmo e princípio
de seus atos. Isso nos indica que a liberdade
é a terceira nota” Stork e Echevarría (2005, p. 36).
Por último, a dialogicidade, que é aquela porta de
entrada ou de saída de um para o outro. Conhece-se uma
pessoa a partir do momento em que ela fala. O Dar-se, o deixar
entrar ou o entrar no outro se dá primordialmente pelo
diálogo. Ou seja, Subentende-se, que preso ao corpo o
homem precisa sair e viajar rumo ao outro e isso só acontece
pela dialogicidade e, viajando
ao outro, o homem pode construir (manifestar),
é um íntimo que quer se libertar para se manifestar e tudo isso
só é possível pelo dialogar. “Dissemos que uma forma de manifestar a intimidade
é falar: o homem necessita dialogar”. Stork e Echevarría (2005, p. 39).
Alguns problemas são incômodos
em Stork e Echevarría (2005) O primeiro problema
é precisar de quatro notas ou palavras para concluir “pessoa”. São as partes já
combatidas por Sócrates. A velha dificuldade de se desapegar de uma língua
contaminada e que quando enumera, temporaliza e localiza, abre espaço para um
debate infinito (a humanidade não pode viver de um constante conflito – o ideal
é encerrar uma temática com a palavra certa e já partir para outro assunto). O
outro problema reforça o primeiro, logo na primeira nota - a intimidade – o leitor é obrigado a pensar: - se a intimidade é debatida
com mais força depois da percepção de que grupos excluídos são “homens”, e
isso é bem recente na história, implica dizer que o mesmo pode acontecer mais
tarde, até com outras espécies, animais, por exemplo. Isso mostra a
temporalidade do termo “intimidade” hoje usado só para humanos, ontem usado só
para heterossexuais, cristãos, homens e brancos. Dessa forma achar a “palavra”
que melhor essencializa o “homem” não vai acabar nunca. O signo intimidade é tão temporal que com alguns
cliques e cruzamento de dados se sabe mais da pessoa do que a própria pessoa. O
“eu” está escancarado e pode piorar.
A Intimidade
tem tudo para cair em desuso em bem pouco tempo, porque ela não está mais
dentro das pessoas, está em pedaços espalhados pela internet, por exemplo. O
termo precisará ser substituído tanto no seu código quanto no seu
signo/significante e significado, por outro que nomeie melhor esse “ser” que
conversa com o corpo vez por outra, mas que não possui mais segredos guardados
dentro de si. Num olhar mais atento, a observação feita neste parágrafo pode se
estender para o caso da manifestação, da
liberdade e da dialogicidade. Contudo, pode até ser que algum dos outros termos
resista e sejam realmente aquilo que os dois antropólogos querem expressar,
haja vista alguns já terem sido tão significados e resignificados por vários
filósofos.
É esse o incômodo: a enumeração
do “ser” com várias palavras ou com alguma que não resiste ao tempo por
desconsiderar outros seres. Sabe-se que é uma falha na língua.
Portanto, de resto, há sim uma
relação conceitual da “pessoa” de Stork e Echevarría (2005) com o “homem” da antiguidade, da idade
média, o moderno e o contemporâneo. Uma relação que chama para o dilema da
procura de uma essência a ser nomeada de forma particular e universal a esse
ser complexo que vem habitando a terra. A relação dos autores com a procura,
travada desde muito tempo, é tamanha que se repete a problemática que todos os
outros enfrentaram: a de se livrar da língua “humana” contaminada por vivências
de lugar, de época e que tende a forçar o emissor a dar mais de um predicativo
ao sujeito sempre provocando, assim, um debate infinito.
REFERÊNCIAS
Dantas, José Carlos. Antropologia filosófica / José Carlos Dantas. – São Luís: UemaNet,
2011.
FRASSON, Antonio Carlos,:JUNIOR, Constantino Ribeiro
de Oliveira. METODOLOGIA DA PESQUISA
CIENTÍFICA. São Luís, Maranhão : 2010
Lakatos, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica 1 Marina de Andrade
Marconi, Eva
Maria
Lakatos. - 5. ed. - São Paulo : Atlas 2003.
PAVIANI.
Jayme. Ética e aprendizagem em Platão. HYPNOS,
São Paulo, número 27, 2º semestre 2011, p. 246-259
PLATÃO. Ménon.
Tradução de Ernesto R. Gomes. Lisboa: Edições Colibri, 1992.
PLATÃO. Fédon.
Introdução e comentários de Maria Arminda Alves de Sousa. Porto: Porto Editora,
1995.
Silva, José Maria da. Apresentação
de trabalhos acadêmicos: normas e técnicas/José Maria da Silva , Emerson Sena da Silveira. 5.
Ed. – Petrópolis, RJ : Vozes, 2009
A partir da leitura e percepção do texto acima, Produza um texto dissertativo-argumentativo a partir do tema “OS LIMITES DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO NO MUNDO CONTEMPORÂNEO”.
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