quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Síntese e análise do acórdão do STJ contra a “reserva do possível” brasileira que pode ferir normas e princípios Constitucionais à Luz da Hermenêutica Jurídica.

               O Brasil nunca conseguiu atender satisfatoriamente os contribuintes que demandam por serviços públicos de qualidade. A justificativa de quem administra os recursos é sempre a mesma: que a arrecadação não é suficiente.  Essa proposição resulta naquilo que os juristas chamam de “reserva do possível”. Caso interessante é o movido pelo município de Criciúma acerca do acesso à creche aos menores de zero a seis anos.

              “A tese da reserva do possível assenta-se desde os romanos, incorporada na tradição ocidental”. No Brasil, é só com a Constituição de 1988 que vários direitos foram inclusos, pelo menos na Lei maior, para serem ofertados de forma igual para todos. O problema central passou a ser o preço que os brasileiros pagariam por esses direitos – a carga tributária que em 1947 era de 13,80% do PIB passou dos 36% em 2011. O dilema, justamente, é como regrar algo que é escasso sem ofender a legislação e princípios vigentes?

              E mesmo gastando quase a metade do que o país produz, os governantes têm alegado na justiça que os serviços são ruins e não devem ser servidos na totalidade porque os recursos são poucos. No caso do recorrente município de Criciúma, a procuradora Patrícia Tatiana Scimimidt e outros usam a famosa “reserva do possível” numa questão que envolve o oferecimento de creches aos menores de zero a seis anos.

          É sabido que por aqui a contribuição tributária é alta. Subentende-se da tese do Recorrido e do Relator Ministro Humberto Martins, que a verdade é que é comum a coisa pública não se planejar de forma eficaz. O Relator chega a dizer que “o gasto com festividades ou propagandas governamentais pode ser traduzido na ausência de dinheiro para a prestação de uma educação de qualidade”.

              Adendo interessante são os métodos ou técnicas usadas na decisão. É perceptível o Método GRAMATICAL quando da citação seca da letra da lei, que ocorre, para defesa da necessidade de se oferecer creches aos menores de zero a seis anos, ratificado pelo “art. 277 da CF. e o 4º da Lei n. 8.069/90 que dispõe que a educação deve ser tratada pelo Estado como absoluta prioridade”. Nesse sentido as palavras chaves “absoluta” e “prioridade” significam, gramaticalmente, o que elas pretendem significar; Ocorre também a interpretação SISTEMÁTICA que é quando o texto da peça estabelece relação de uma Lei com outras, frisa-se a Constituição Federal (CF) de 88, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei de Direitrizes e Bases da Educação Brasileira 9394/96. Se quisermos falar de método ou técnica HISTÓRICA, de ANALOGIA HERMENÊUTICA, COSTUME e SOCIOLÓGICA é possível retirar do acórdão, o momento em que o relator cita trechos de Hannan Arent e decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal como o julgamento de RE 436.996/sp DE Relatoria do Ministro Celso de Mello. Outra técnica interpretativa do caso em concreto é a do TELEOLÓGICO, isso porque a todo instante o relator aponta finalidades na legislação.

                  Há também Normas e princípios de Hermenêutica Jurídicas bem fáceis de serem identificados na peça, é o caso do relator conclamar os Direitos Fundamentais descritos na Lei Maior. Isso porque aqui é respeitada a CF de 88 em detrimento do requerido, que não é positivado. Pode-se dizer que entram em ação nesse momento o PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO, e quando são referendadas diversas leis para amparar o Acórdão e refutar a “reserva do possível”, nota-se o PRINCÍPIO DA UNICIDADE E DA CONCORDÂNCIA PRÁTICA. E para que o município de Criciúma não haja em desconformidade com a Federação é adotado o PRINCÍPIO DA EXATIDÃO FUNCIONAL E EFEITO INTEGRADOR. De nada adiantaria todos esses princípios se não houvesse o da FORÇA NORMATIVA E MÁXIMA EFETIVIDADE DA CONSTITUIÇÃO.

                 Portanto, é acertada a decisão do Acórdão relatado pelo Ministro Humberto Martins requerido pelo município de Criciúma no que tange a indisponibilidade de recursos para o oferecimento de vagas em creches aos menores de seis anos e outros. A alegação do requerente não pode deixar de ser interessante, porque traz a “Reserva do Possível”. Nascida na Alemanha, essa teoria acabou com a querela que envolvia a quantidade de vagas que o Estado devia oferecer na Universidade. À época, a corte alemã derrubou por completo a ideia de que o Estado deveria estar obrigado a oferecer a quantidade suficiente de vagas nas universidades públicas que atendessem a todos os estudantes. A ideia foi bastante discutida e a acatada foi à jurisprudência do Supremo. Mais de três décadas depois, o Brasil discute essa tese, contudo, segundo a própria decisão da relatoria, ela não pode ser usada como regra. De qualquer forma, é um debate válido e que deve ser “acalorado” mesmo, principalmente em época de crise. O problema é que os administradores têm tentado justificar os péssimos serviços de moradia, educação, saúde e segurança com a alegação de baixas finanças. Mesmo assim, por aqui, o trabalhador assalariado tem ficado sem creches, com a violência das escolas e dos hospitais públicos. O acórdão vem, justamente, combater esse tipo de desigualdade obrigando os municípios a se planejarem mais. Em certo trecho o relator é enfático contra a promoção de festividades em detrimento de tantos problemas de ordem financeira.

 

    

    

 

 

REFERÊNCIAS

 

A evolução da carga tributária no Brasil Disponível em < http: //www .catho.com.br /cursos/index.php ?p=artigo&id_artigo=1441&acao=exibir> Acesso em 02 maio 2015

 

CARDOSO. Isaac Sabino. O Planejamento Estratégico Situacional, a “reserva do possível” e a hipocrisia dos políticos administradores brasileiros. Disponível em <https://isaacsabino.blogspot.com/2015/05/o-planejamento-estrategico-situacional.html> Acesso em 15 de abril de 2021

 

Disponível em <http://www.impostometro.com.br/posts/carga-tributaria-brasileira> acesso em 02 de maio 2015

 

 

Silva, José Maria da. Apresentação de trabalhos acadêmicos: normas e técnicas/José  Maria da Silva , Emerson Sena da Silveira. 5. Ed. – Petrópolis, RJ : Vozes, 2009

 

STJ. RESERVA DO POSSÍVEL. Disponível em < http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Educacao/Jurisprudencia/STJ-creche%20-%20tese%20reserva%20do%20poss%C3%ADvel.pdf> acesso em 15 de abril de 2021

 

 

Teoria da reserva do possível Disponível em <http://jus.com.br/artigos/24062/teoria-da-reserva-do-pppossível>possivel> cesso em 02 maio 2015

 

 


 

 

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